A onça-pintada (Panthera onca) é mais do que um símbolo da fauna brasileira: ela é um elo vital para a saúde dos ecossistemas. Como predador de topo, sua presença regula populações de presas e mantém o equilíbrio natural. Mas, apesar da importância ecológica, cultural e econômica, ainda sabemos pouco sobre como esse felino vive em algumas regiões remotas do Brasil, como a costa do Amapá, onde florestas, manguezais e campos inundáveis se encontram.
Avançar nesse conhecimento é essencial para conservar não apenas a espécie, mas também toda a biodiversidade associada ao seu habitat. No entanto, estudar um animal esquivo, que percorre grandes territórios e vive em áreas de difícil acesso, é um desafio. É nesse ponto que a tecnologia se torna uma aliada fundamental, permitindo revelar os segredos da vida da onça-pintada e oferecendo subsídios para ações de conservação mais eficazes.
Como a tecnologia ajuda a conhecer a onça-pintada
Aqui no Projeto Onças do Amapá, nossos pesquisadores utilizam recursos tecnológicos de ponta para estudar a espécie em ambientes desafiadores, como ilhas costeiras, manguezais e florestas inundáveis.
Entre os métodos empregados estão:
- Armadilhas fotográficas: registram imagens de animais de forma não invasiva, permitindo identificar indivíduos, estimar populações e analisar padrões de atividade.
- Drones com câmeras termais: possibilitam o monitoramento em áreas de difícil acesso e a detecção de animais à noite ou sob vegetação densa, complementando os métodos tradicionais de campo.
- Coleiras de GPS: revelam os deslocamentos das onças em tempo real, mostrando como elas utilizam diferentes habitats e interagem com áreas ocupadas por comunidades locais.
- Estudos genéticos e biobancos: permitem avaliar a diversidade genética, detectar sinais de endogamia e preservar material biológico para futuras pesquisas.
Essas ferramentas tecnológicas não substituem o conhecimento tradicional das comunidades, mas somam-se a ele, fortalecendo uma abordagem integrada de ciência e cultura.

Tecnologia e conservação da biodiversidade
O uso de tecnologia em pesquisas de campo vai além de entender apenas a vida da onça. Ele fornece dados cruciais para a conservação de ecossistemas inteiros. Estudos mostram que predadores de topo, como a onça-pintada, regulam populações de presas e influenciam diretamente a saúde de florestas e campos.
Quando associadas a análises espaciais e modelos econômicos, as informações obtidas por drones, GPS e câmeras ajudam a desenvolver estratégias de manejo sustentável, apoiar o ecoturismo responsável e orientar políticas públicas. Segundo a International Union for Conservation of Nature (IUCN), tecnologias como sensores remotos e bioinformática são hoje fundamentais para enfrentar a perda global de biodiversidade e planejar corredores ecológicos que garantam a sobrevivência das espécies.
Um exemplo recente vem da conservação da Saíra-apunhalada (Nemosia rourei), ave criticamente ameaçada e endêmica da Mata Atlântica. O Instituto Marcos Daniel, em parceria com organizações internacionais, utiliza métodos modernos de vigilância, monitoramento e proteção direta de ninhos, combinados com ciência cidadã e participação comunitária. Essa estratégia tem permitido registrar comportamentos reprodutivos, reduzir ameaças e envolver moradores locais na proteção da espécie. O relatório técnico “Establishing nest protection for the extremely rare Cherry-throated Tanager, Brazil” (2022–2023), produzido pelo Instituto Marcos Daniel e ZGAP, destaca como a combinação de tecnologia e mobilização social é essencial para evitar a extinção dessa ave rara.
Outro exemplo é o uso de drones para contar boto-cor-de-rosa no Amazonas. A WWF-Brasil e o Instituto Mamirauá usam, desde 2016, imagens aéreas com drones para comparar resultados com os métodos tradicionais feitos manualmente, mostrando que a tecnologia pode aumentar a eficiência e cobertura do monitoramento de populações aquáticas, menos acessíveis pelas vias naturais.
Um futuro conectado entre ciência e comunidades
No Amapá, as onças dividem território com povos indígenas, comunidades ribeirinhas e quilombolas. Por isso, o projeto aposta em um modelo de pesquisa participativa, que alia tecnologia de ponta à sabedoria local. Oficinas, entrevistas e atividades de educação ambiental integram moradores ao processo científico, fortalecendo tanto a conservação quanto o desenvolvimento sustentável.
Ao unir tecnologia, ciência e comunidades, abrimos caminhos para que a onça-pintada continue a rugir nas florestas amazônicas — um símbolo vivo de equilíbrio ecológico e cultural.
