Fazer ciência na Amazônia é um desafio que começa muito antes de chegar ao campo. É enfrentar distâncias longas, acessar regiões de difícil locomoção, lidar com o imprevisível do clima e, ainda assim, seguir com o mesmo objetivo: compreender como a vida se organiza e se mantém em equilíbrio em um dos ecossistemas mais ricos e complexos do planeta.
É nesse cenário que o Onças do Amapá atua. Nosso projeto nasceu com o propósito de estudar as interações entre as onças-pintadas, os ecossistemas amazônicos e as comunidades que vivem nas regiões ainda pouco estudadas, em áreas costeiras e continentais do estado. Mais do que um estudo sobre um grande felino, o projeto representa uma oportunidade única de unir ciência, tecnologia e conhecimento tradicional para construir um modelo de conservação que também valoriza as pessoas e os modos de vida locais.
Nossa equipe é formada por pesquisadores, veterinários, estudantes e integrantes de comunidades tradicionais que trabalham lado a lado para responder a perguntas fundamentais: onde estão as onças do Amapá? Como elas se movimentam? Quais são suas presas? E, principalmente, como podemos garantir que humanos e onças continuem coexistindo nesse território?
A ciência que nasce no campo e ganha força no laboratório
As respostas para essas perguntas começam nas expedições científicas. Entre as florestas e os manguezais, montamos armadilhas fotográficas, operamos drones, câmeras termais e instalamos coleiras de GPS para entender os deslocamentos das onças-pintadas. Cada registro ajuda a compor um retrato mais completo da espécie e da biodiversidade que a cerca.
Quando uma onça é capturada, o trabalho é ainda mais minucioso. A equipe veterinária realiza exames clínicos, coleta amostras biológicas e monitora a saúde do animal antes de devolvê-lo ao ambiente natural. Parte dessas amostras vai para laboratórios parceiros, onde são analisadas geneticamente e armazenadas em um biobanco de germoplasma, uma verdadeira biblioteca genética que ajuda a proteger o futuro da espécie.
Esse esforço científico é inédito em muitas áreas do Amapá e da Amazônia. Ao reunir dados ecológicos, genéticos e sociais, conseguimos entender melhor como as populações de onças estão distribuídas e como interagem com os ecossistemas e as comunidades humanas.
Conhecimento que se constrói junto
A ciência que fazemos não acontece sozinha. O Onças do Amapá é, antes de tudo, um projeto coletivo. Pescadores artesanais, indígenas e moradores de comunidades tradicionais participam das atividades de campo, ajudam no acesso às áreas de estudo e compartilham saberes fundamentais sobre o comportamento da fauna e as transformações do território.
Essa troca de experiências é o que torna o projeto realmente completo: de um lado, o conhecimento científico; do outro, a sabedoria de quem vive e conhece a floresta todos os dias. Juntos, construímos caminhos para uma convivência mais harmônica entre pessoas e natureza, mostrando que a conservação pode — e deve — caminhar junto com o desenvolvimento sustentável.
Nos bastidores do Onças do Amapá, cada dado coletado, cada imagem e cada conversa revelam algo essencial sobre a Amazônia e sobre nós mesmos. É esse olhar científico e humano que guia nossa atuação: entender para conservar, conservar para coexistir.
Mais do que gerar resultados acadêmicos, o que fazemos é plantar um legado de conhecimento e inspiração. Ser cientista aqui é muito mais do que produzir dados, é construir pontes entre mundos, ampliar horizontes e reafirmar, a cada expedição, que a ciência pode transformar realidades.
